A conta da NFL só fecha com a experiência

Já imaginou um clube gastar R$ 25 bilhões na construção de um estádio para receber somente dez jogos por ano? O que pode parecer insanidade para qualquer pessoa é a realidade dos times da NFL, nos EUA, que a cada ano que passa inauguram e/ou anunciam projetos de novos e bilionários estádios.

Então, como se faz para fechar essa conta em um esporte em que os times jogam apenas dez jogos em casa por ano, sendo dois deles de pré-temporada? Para justificar tamanho investimento, partimos do princípio de que é primordial que todos os dez jogos anuais estejam sempre lotados.

O fanatismo do povo dos EUA pelo futebol americano somado à escassez de jogos no calendário ajuda bastante a manter as taxas de ocupação dos estádios perto de 100%. Mas fornecer uma experiência incrível no dia do jogo também tem um papel muito importante na hora de vender todas as entradas.

Na verdade, a maioria dos ingressos já estão vendidos muito antes da tabela de jogos ser anunciada, normalmente no início de maio. O chamado “Season Ticket” (“Ingresso para a temporada”, em tradução livre) é quase uma instituição norte-americana e motivo de orgulho para os seus donos. A fila de espera para a compra desse pacote dos times mais populares pode durar décadas.

Recentemente, foi anunciado que o Green Bay Packers possuía uma lista de espera com mais de 150 mil nomes, número maior que a própria população da cidade da equipe. Estimativas apontam que, para contemplar a todos, a espera poderia demorar até 60 anos.

Já que ter os estádios lotados em todos os jogos é uma realidade para quase todos os 32 times da NFL, faz-se necessário adicionar mais linhas de receitas de “matchday” (“dia de jogo”, em tradução livre) nesse plano de negócios bilionário. Aqui, podemos dizer que o show realmente começa a aparecer.  Os estádios são pensados para que absolutamente tudo seja incrível, desde a compra dos ingressos até o retorno para casa, além de proporcionar centenas de oportunidades de consumo para diversos tipos de públicos distintos.

O chamado público geral é brindado com muitas facilidades que vão desde a compra antecipada de estacionamento, que também pode ser adquirido por toda a temporada, até a escolha do horário que você deseja receber, na sua cadeira, a compra antecipada de alimentos e bebidas.

Já que estamos falando em cadeiras, é importante pontuar que o respeito à numeração do seu assento tem um papel primordial para o sucesso da grande experiência dentro dos estádios. Já que o risco de alguém com ingresso mais barato se sentar nos assentos mais caros é baixo, somado ao fato de que a violência entre as torcidas é quase inexistente, os estádios não precisam ser divididos em setores com barreiras físicas. Ou seja: o torcedor, independentemente do número da sua cadeira, pode circular por quase todas as partes e buscar a melhor opção de alimentos ou entretenimento nos corredores dos estádios. Quem está no quarto andar pode comer uma deliciosa pizza no nível 1 e depois assistir a um espetáculo de dança no segundo piso e comprar uma camisa oficial na loja localizada no setor que recebe o nome de um patrocinador antes de voltar para o seu assento para acompanhar a partida.

Uma poderosa rede de wi-fi, que funciona perfeitamente mesmo com 80 mil pessoas no estádio, também permite que qualquer torcedor possa comprar alimentos, bebidas, camisas oficiais etc. sem sair do assento. Além de possibilitar, claro, que o fã esteja sempre conectado, subindo milhares de vídeos e fotos das partidas.

Para um público mais requintado e que está disposto a gastar mais, o que não falta é opção. Lounges e camarotes, com requinte e decoração de um hotel cinco estrelas, ficam espalhados por todo o estádio. Nesses espaços, é possível comprar pratos de alta gastronomia, beber os melhores espumantes franceses e até receber a visita de uma estrela do passado no intervalo da partida para fotos e autógrafos.

Dessa maneira, atraindo diversos tipos de público, além de possibilitar a venda de ingressos com uma variação enorme de preços, o valor do ingresso se torna apenas uma fração do que o torcedor realmente gasta nos dias de jogos.

Passada a curta temporada de futebol americano, de setembro a dezembro, os estádios se transformam em um enorme centro de eventos. A capacidade de transformação dos espaços também chama a atenção. Os camarotes viram escritórios para reuniões, as salas de conferência de imprensa se transformam em auditórios para palestras, os lounges recebem festas e coquetéis animados, e os gramados dão espaços para os maiores artistas do planeta, além de grandes eventos de outras modalidades esportivas.

Além da extraordinária capacidade de utilizar cada espaço dos estádios para receber eventos, o que podemos tirar de lição é o foco no torcedor e a gigantesca preocupação com a experiência do consumidor. Enquanto alguns estádios no Brasil seguem vendendo ingressos, nos EUA eles vendem experiências. Por mais sutil que possa parecer essa diferença, a maneira de encarar o negócio é a chave para o sucesso de um investimento bilionário. 

Enquanto o vendedor de ingressos atinge seu objetivo na bilheteria, quem vende experiência fica satisfeito somente quando o seu cliente retorna tranquilamente para casa. O investimento pode ser muito maior, mas o retorno é imensurável.

Romulo Macedo é chefe de operações de mídia da Copa América 2024 e escreve mensalmente na Máquina do Esporte

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