Ex-funcionária acusa empresa suspeita de negligência de fraudes trabalhistas e desvio de função

Empresa suspeita de negligência no atendimento do paciente Reinaldo Nogueira Júnior, a Cuidar Mais Home Care é alvo de denúncias de fraudes trabalhistas e desvio de função.

Edileuza Barbosa Pereira, uma das técnicas de enfermagem que prestou assistência a Reinaldo, trabalhou na Cuidar Mais até fevereiro deste ano. Em conversa com o TopMídiaNews, ela descreveu diversas situações vivenciadas tanto por profissionais quanto por pacientes.

Segundo ela, os enfermeiros compareciam apenas uma vez na semana à casa dos pacientes do SUS, restando aos técnicos todo o trabalho principal.

“O técnico que fazia tudo, que aspirava o ferimento. Pelo Coren-MS (Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso do Sul), é o enfermeiro que realiza isso, mas a gente fazia devido à emergência. Era o fonoaudiólogo e a gente que aspirava o ferimento do Reinaldo para não ficar com odor porque eles não iam”, denuncia Edileuza.

A descrição de serviços exclusivos de enfermeiros pode ser acessada aqui. Ainda conforme a técnica de enfermagem, os enfermeiros só compareciam na casa dos pacientes uma vez por semana, apenas para buscar os relatórios do quadro de saúde, realizados pelos técnicos.

“O certo era o enfermeiro comparecer todo dia, principalmente no caso como o do Reinaldo, que tinha uma lesão que só foi aumentando, mas eles só compareciam quando a Maria Benedita ligava brava na empresa”, relata.

Para Edileuza, Reinaldo não teve o cuidado devido. “A gente que fazia os curativos, dava toda a medicação, pomada e quem comprava era a Maria. Nas outras home cares, quem dá tudo é a empresa, desde fita, a luvas descartáveis, tudo. No caso do Reinaldo, quem comprava era a Maria. Ela gastou muito e isso acontecia com muitos pacientes”, afirma.

Edileuza explica que saiu da Cuidar Mais Home Care após ser informada que a empresa estaria falindo. Segundo ela, uma paciente foi abandonada pela empresa, sem aviso. “Ela foi largada, ficando sem atendimento. A filha está processando. Eles dispensaram os quatro técnicos e a filha ficou cuidando sozinha. A paciente tem traqueostomia”, denuncia.

 

A técnica de enfermagem Edileuza Barbosa Pereira atendeu o paciente Reinaldo Nogueira Júnior (Foto: Arquivo Pessoal)

 

“Quando vence o contrato com a prefeitura, a empresa precisa avisar os familiares com ao menos 30 dias de antecedência, porém avisaram com três dias apenas, afirmando que estariam dispensando a paciente”, explica a técnica em enfermagem.

Ela também relata que a falta de insumos e negligência ocorria apenas em atendimentos para pacientes do SUS. 

“Os pacientes que eram plano particular eram muito bem tratados, mas o da prefeitura deixavam a desejar. Fiz plantão com um paciente de um plano de saúde, atendido pela empresa, e o atendimento era totalmente diferente”, frisa.

Contrato “de boca” e atrasos nos salários

Além dos desvios de funções, a funcionária também relata constantes atrasos no salário, além de acordo informal.

“Eles pagavam muito atrasado. Os funcionários precisavam ficar cobrando, muitos ficavam até com vergonha. A gente nem assinava contrato. Levávamos o currículo, realizávamos uma entrevista e começávamos a trabalhar, sem contrato, sem nada. Apenas os enfermeiros tinham contrato. As outras home cares tem contrato, mas na Cuidar Mais era ‘de boca’ com a empresa. A gente recebia só pelos dias que trabalhávamos e se não fossemos não recebíamos”, detalha.

Os funcionários também lidavam frequentemente com o excesso de trabalho. A técnica de enfermagem conta que o acordado muitas vezes foi descumprido.

“Eu trabalhava 24h por 24h de descanso, porém, ultimamente, eu estava fazendo 36h por 38h. Teve uma semana que fiquei 48 horas sem ir na minha casa, atendendo direto. Teve uma vez que fiquei a semana inteira trabalhando. O meu marido só ia me levar roupa”.

Suspeita de negligência

Reinaldo Nogueira Júnior, falecido em outubro de 2023, foi um dos pacientes atendidos pela empresa contratada pelo SUS (Serviço Único de Saúde). Ele precisou dos cuidados domiciliares após acidente de trânsito em 1º de maio de 2016, quando sofreu traumatismo crânio encefálico, desenvolvendo paraplegia e hidrocefalia.

O paciente começou a ser atendido em home care após longa batalha judicial liderada pela Defensoria Pública, que ajuizou ação em outubro de 2017. Entre atrasos e liminares, Reinaldo foi atendido por cerca de cinco anos, como confirma a mãe, Maria Benedita Garcia Leite.

De acordo com Maria Benedita, a primeira empresa a atender ao filho foi excelente, prestando tudo o que estava previsto no acordo. “O atendimento era 24 horas, recebendo o cuidado e atenção da empresa. Ele recebia cuidados de fisioterapia, fonoaudióloga, além da enfermagem. A fisioterapia era diária, por cerca de uma hora, já o acompanhamento da enfermagem era 24 horas. Era maravilhoso”, conta.

Conforme extrato enviado pela Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) à Justiça, Reinaldo foi acolhido, em um primeiro momento, por Jean Marcell Cacula da Rocha Serviços de Home Care, a partir de 29 de março de 2018. A empresa firmou contrato de seis meses cobrando R$ 1 mil para três sessões de fisioterapia e duas de fonoaudiologia semanais. Não há detalhes sobre os valores de outros serviços nos autos.

Na sequência, a Sesau descontinuou o serviço e foi acionada por descumprir a decisão judicial. Neste período, assumiu a empresa KZT Serviços Médicos de Atenção Domiciliar. A disputa judicial se alongou, mas a prefeitura normalizou o atendimento. Maria Benedita aponta que, infelizmente, tudo mudou após nova licitação, que resultou na Cuidar Mais Home Care como vencedora.

A mãe em luto frisa que os profissionais eram excelentes, porém apenas compareciam após muita insistência, telefonando para a empresa. Segundo ela, a Cuidar Mais também deixou de comprar parte dos medicamentos e curativos usados por Reinaldo, restando à família adquirir os insumos.

“Eu tinha que ficar ligando, chamando eles para realizarem o atendimento. Apenas os profissionais que eram ótimos. Eles me ajudavam e prestavam o auxílio, mas a empresa não valia nada e deixou várias vezes de prestar apoio ao meu filho”, desabafa Maria Benedita.

Mãe e filho se despediram em 2023 (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Conforme a mãe, Reinaldo adquiriu uma escara – ferida na pele que surge quando o paciente fica muito tempo na mesma posição -durante uma internação hospitalar. Assim que recebeu alta médica, o ferimento era pequeno, porém cresceu muito por ausência de cuidados. 

“Ele pegou uma escara no hospital e eles não vinham olhar, deixavam por conta, não queriam nem saber. Eu mesmo tinha que cuidar, comprar os remédios. Eu não ia deixar de ajudar o meu filho numa situação ruim, sem ter nem o remédio. Devido à negligência, eu mesma tive que levar ao hospital. Aí então compareceram, quando chamei o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e viram que o negócio estava feio, mas já não adiantava nada”, relembra a mãe.

A mãe destaca que os próprios profissionais ficavam indignados com a empresa. 



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