Governo Federal está sendo unilateral em revisar taxa de desmatamento no Pantanal, segundo analista

A nota técnica do Ministério do Meio Ambiente critica a legislação de Mato Grosso do Sul e a porcentagem recomendada para desmatamento do Pantanal sul-mato-grossense. Entretanto, segundo o analista em meio ambiente, Ricardo Eboli, o governo federal está sendo unilateral por enxergar apenas a parte ecológica e esquecer da parte econômica. Uma das normas de Mato Grosso do Sul para a preservação do bioma é o decreto estadual n° 14.273, de outubro de 2015, que permite a supressão de 60% de vegetação nativa de campo e 50% de vegetação nativa florestal.

 

Inclusive, Eboli assegura que, antes desse decreto, o regramento para o desmatamento segue o Código Florestal de 1965, podendo desmatar até 80%. “O Pantanal de Mato Grosso do Sul não tinha regramento específico para determinar o quanto podia se desmatar. Seguia-se o Código Florestal, que permite desmatar até 80% das fazendas do bioma. Depois, veio o novo Código Florestal no ano de 2012, que determinou, no artigo 10º, que os órgãos de meio ambiente deveriam estabelecer os parâmetros para definir as autorizações de desmatamento, as áreas”, explicou.

O ex-secretário estadual de Meio Ambiente reforça ainda que o decreto estadual foi feito após diversas discussões que envolveram os pantaneiros e as instituições de pesquisa, na ocasião, a Embrapa Pantanal e a Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) da USP (Universidade de São Paulo). “Não foi um decreto elaborado sem ouvir a sociedade e principalmente as instituições de pesquisa. Diferentemente dessa nota técnica e dessa proposta de resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), estão vindo sem ouvir os pantaneiros, sem ouvir os técnicos do governo do Estado, sem ouvir a sociedade civil. É algo unilateral”, define.

“Recebemos uma análise que era só ambiental para preservar o Pantanal de 35% da Embrapa e a Esalq falou que, para ser viável economicamente, a pecuária no Pantanal precisava desmatar 77%. Então, de um lado teve 35% recomendando e de outro, 77%. Como os valores são diferentes, a gente teve que arbitrá-los. Esse valor arbitrário também levou uma recomendação da Embrapa Pantanal, de uma circular técnica que fala que em torno de 50% seria viável, com a substituição de pastagem no Pantanal”, complementa.

 

Preservação de 85% Dados apresentados durante a reunião do Ceca (Conselho Estadual de Controle Ambiental) pelo titular da Semadesc (Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), Jaime Verruck, mostram que o Pantanal de Mato Grosso do Sul já reteve quase 85 % da área de cobertura original. Os números apontam que as ações do governo do Estado, lideradas pela Semadesc e pelo Imasul (Instituto Ambiental do Mato Grosso do Sul), têm ajudado a manter esse indicador. De 15 de agosto de 2019 a 14 de abril de 2023, o instituto autorizou intervenções na vegetação de 194 mil hectares do Pantanal sul-mato-grossense, equivalente a 2,16% da área do bioma.

Estas são informações que, para o analista, precisam ser levadas em consideração pelo governo federal, justamente pelo fato do percentual preservado e de a região ser a maior produtora de bezerro do país. “É preciso que o Ministério do Meio Ambiente, que o governo federal reflita, pois 84% do Pantanal continua intacto com a vegetação nativa, sendo o maior produtor de gado magro do Brasil. Então, que modelo é esse que pode estar errado? Uma política pública ambiental desta proposta, pelo Ministério do Ambiente, é mais um fator de provocar o êxodo da população pantaneira, dos produtores rurais do Pantanal. Tá havendo uma injustiça nisso, um desrespeito aos técnicos da Embrapa, da Esalq, do Imasul, que fizeram o decreto de 2015. O governo federal não tem empatia com os produtores pantaneiros. É triste ver muitas famílias empobrecendo”, frisou.

O REDD+ Serra do Amolar criou o primeiro projeto de emissão de créditos de carbono no Pantanal. Ele foi desenvolvido pelo IHP (Instituto Homem Pantaneiro) e contará com o apoio da Agrotools, empresa líder em tecnologia e inteligência em agronegócios, fornecendo mais de 135 mil hectares de dados. O equivalente a 200 mil campos de futebol será monitorado pela AGTech. Este é o primeiro projeto no Pantanal, uma das maiores áreas úmidas contínuas da Terra, a ser certificado pela Verra. A Verra é o maior organismo de certificação de créditos de carbono
do mundo e líder na abordagem REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal). Ângelo Rabelo, presidente do IHP, disse que o uso da tecnologia fornecida pela Agrotools permitirá um monitoramento eficaz, tanto para garantir a confiabilidade das estatísticas quanto para evitar o desmatamento na região, que é um corredor de biodiversidade e espaço, como onças vivas, pintadas e outros animais silvestres.

Obras de estradas

Em relação à construção de novas estradas no Pantanal, o analista Ricardo Eboli garante que elas são fundamentais para transportar a produção e que só não podem atrapalhar o pulso de inundação do bioma. Cabe ressaltar que uma medida cautelar, adotada pelo TCE-MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul), suspendeu as obras de implantação de revestimento primário da MS-228, localizada na região do Pantanal. De acordo com o documento, a obra não tinha o EVTA (Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental) e nem as licenças ambientais adequadas mencionadas no Eia-Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental). “As estradas do Pantanal estão sendo consideradas uma forma devastadora para a região, por transportarem a produção do Pantanal, mas estradas não transportam só bois, não, transportam gente doente, transportam criança para a escola. As estradas no Pantanal só não podem interromper o fluxo de água, não ter barramento, tem que ter essas manilhas.”

O secretário trouxe, ainda, uma indagação sobre a BR262 que corta o Pantanal e que se não pode haver outras
estradas que essa seja derrubada. “O Pantanal ter que continuar da forma antiga, de 200 anos atrás, com carro de boi e trator, isso é uma injustiça. Então, em vez de propor legislações como essa, do Conama, que inviabiliza uma região unilateralmente por conta da natureza, tem que ver a realidade humana. Existem pessoas ali e não é o governo federal que está tendo essa sensibilidade, para ver as pessoas”, sugere. “O Pantanal vai deixar de ser Pantanal se os pantaneiros saírem de lá, se a atividade econômica pecuária deixar de existir. O Pantanal só é o que é por conta do pulso de inundação de chuva, da cheia e da seca, e por conta da pecuária existente”, desabafa.

Fonte: O Estado MS

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