Com mais de 90% de sua matriz elétrica oriunda de fontes renováveis, Mato Grosso do Sul caminha para servir de modelo nacional na implementação de uma política sólida e abrangente de transição energética convergindo com os objetivos de mitigação das causas das mudanças climáticas estabelecidas pela ONU (Organização das Nações Unidas). Em 2023 a capacidade instalada de geração de energia no Estado foi de 7,236 milhões de quilowatts (kW), segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), sendo que as usinas de energia solar responderam por 49,30% desse total, as usinas de biomassa por 37,21% e as centrais hidrelétricas por outros 5,51%. Apenas 7,98% da energia gerada no Estado no ano passado resultou de fontes não renováveis, como as termelétricas movidas a gás ou óleo diesel.
Esse potencial coloca Mato Grosso do Sul numa situação estratégica para se tornar, por diversos fatores, o grande campo de implementação de tecnologias para conduzir o país à transição energética, apontou o secretário executivo de Meio Ambiente da Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), Artur Falcette. E mais: “Não basta só converter a matriz energética, para cumprir as metas de descarbonização precisamos avançar em tecnologias para captura e armazenamento do C02 se temos intenção de atingir os objetivos globais para a segunda metade desse século”, completou.
Estudos
Nesse sentido, servidores da Semadesc e membros da Câmara Técnica de Energias Renováveis do Estado participaram de um simpósio sobre o tema, na tarde dessa quinta-feira (19), no auditório LivingLab do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas). A explanação foi feita pela engenheira de Petróleo Nathalia Weber, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa de São Paulo) e co-fundadora da CCS Brasil, associação que pesquisa a captura e armazenamento de carbono no País, além de fazer a representação institucional de empresas do setor.
Weber argumenta que a transição energética de fontes poluentes e finitas para fontes renováveis e limpas é a grande meta do Planeta, entretanto se apresenta improvável diante dos custos que essa transformação demanda, o que pode elevar em até sete vezes o preço final da energia ao consumidor. Dessa forma, uma medida viável e mais prática seria descarbonizar as fontes de energia existentes com a utilização de filtros que capturem o CO2 emitido no processo de produção. O segundo passo seria armazenar esse gás, já condensado, em camadas de rochas subterrâneas localizadas a quilômetros de distância da superfície, onde ficariam permanentemente.
Mato Grosso do Sul desponta com potencial enorme nesse quesito. Weber calcula que só o C02 emitido a partir da produção do Etanol soma 5 milhões de toneladas ao ano. Esse C02 pode ser capturado facilmente porque já sai puro das chaminés das usinas, não sendo necessário filtros para fazer a separação e purificação do gás, o que encareceria o processo.
O setor de bioenergia tem investido na melhoria de eficiência e em novos produtos em Mato Grosso do Sul, afirma o diretor técnico da Biosul (Associação de Produtores de Bioenergia de Mato Grosso do Sul) e membro da Câmara Técnica de Energias Renováveis, Érico Paredes. “Vale observar que são tecnologias desafiadoras em relação à escala de produção, infraestrutura e custo de implementação, por exemplo. Dependem de parcerias estratégicas entre empresas, governos e instituições de pesquisa. Por isso, as políticas públicas de incentivos fiscais são fundamentais”, frisou.
Metas e soluções
As metas de descarbonização do ar do Planeta para as próximas décadas são ambiciosas e sem o processo de captura de carbono não serão atingidas, alerta Weber. Em 2020, a capacidade de captura de carbono do mundo era de 40 milhões de toneladas de C02. A meta para 2030 é de 1.6 bilhão de toneladas de C02 e em 2050 precisa saltar para 7,6 bilhões/ton/C02. Só com reflorestamento, redução do consumo, aumento da eficiência das usinas, substituição de fontes energéticas isso não seria possível.
Falcette concorda com essa premissa, entendendo que a transição energética é um processo amplo e complexo que se dará pela combinação de diferentes processos de mitigação e uso de tecnologia que, ao se somarem, permitirão o avanço da temática. E salienta que Mato Grosso do Sul está atento às inovações no setor visando construir uma política estadual de transição energética que ofereça viabilidade econômica, eficiência operacional e segurança ao empreendedor e à população.
“Estamos acompanhando a regulamentação da matéria pelo Congresso Nacional. Recentemente foi aprovado o Projeto dos Combustíveis do Futuro que traz as diretrizes para captura e armazenamento de carbono. Esse projeto deve ser sancionado no início de outubro pelo presidente da República e vai orientar a elaboração do regramento dos Estados sobre o tema”, frisou.
O secretário acredita que discussões como essa conduzida por Nathalia Weber são de extrema importância para esclarecer o corpo técnico que se encarregará de elaborar a legislação estadual sobre transição energética. Por isso mesmo, devem acontecer outros encontros com especialistas nesse sentido. “Estamos convencidos de que é preciso mais do que medidas de proteção ambiental para frear as mudanças climáticas. Temos que ir além da redução das emissões e procurar capturar e dar a destinação adequada ao C02”, finalizou.